domingo, 26 de fevereiro de 2012

Sortes






Talvez seja sortuda. Talvez seja abençoada. Talvez seja um pouco de ambas, mas a verdade é que apesar de tudo, nunca me pude queixar de falta de sorte na vida. Pelo menos até à data.
E sinto-me uma pessoa completamente privilegiada por mil e um motivos, dos quais vou frisar especialmente o facto de ainda ter avós paternos e maternos.
Não vou mentir, é muito bom, óptimo, um autêntico privilégio. E se calhar nem sempre dei valor a isso.

E tive, até o dia de ontem, uma bisavó com 98 anos. É verdade, 98 anos. Mas enfim, a idade pesa e ninguém é eterno. Nem ela. Nem nada até.
Passei alguns momentos da minha infância com ela, mas infelizmente a memória não é muita. Sei que bebia muito chá, lembro-me disso porque achava incrível alguém conseguir beber tanto chá por dia. Lembro-me que apesar de ter idade bastante avançada, ainda conseguia andar facilmente com a ajuda de canadianas, e consequentemente continuava a ter a mão leve para quem se portasse mal. E língua afiada. Desde sempre me lembro disso, língua bem afiada, resposta sempre pronta a dar.
E acho que fiquei com essa costela dela.
Lembro-me também dela me contar coisas antigas como, por exemplo, ver um carro pela primeira vez. Ensinou-me a fazer colares de flores.
E pouco mais me recordo.
Certamente dei-lhe bem cabo da paciência e do juízo.

E sempre me lembro dela como uma autêntica lutadora. Até aos últimos momentos. Tomara que também tenha ficado com essa costela dela.

A última vez que a vi com vida, já faz algum tempo, mas nesse dia ela estava bem. Sorria. Não me conhecia de lado algum. Melhor, não me reconhecia, que a cabeça já não dava para mais. Mas não foi por isso que deixou de sorrir.

É neste tipo de coisas que chego à conclusão que: além de privilegiada, sou também uma autêntica menina. Sim menina.
Não sei lidar com a morte. Bem, no fundo, acho que ninguém sabe. Talvez.
É neste tipo de coisas que chego também à conclusão que nada é eterno. Que a passagem por esta vida é curta, que devemos mesmo aproveitar ao máximo cada dia como se fosse o último. Nada é certo nesta vida. Acho que a única coisa certa é mesmo a morte.

Que descanses em paz. Olha por nós aí em cima!

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Devaneios às 4h da manhã

Este foi um texto que me surgiu, um dia destes. Não interessa quanto. E às 4h da manhã. Mais minuto, menos minuto. E acontecem coisas fantásticas a essa hora. Tal como a outras, claro. Foi escrito à mão, e agora passa para aqui.
Bem, mas quando escrevo a tais horas, ou sai a coisa mais absurda, ou sai isto (que não deixa de puder ser considerado absurdo, dependendo da interpretação, mente, etc de cada um).

"Esta vida, é algo simplesmente impressionante. Assim, no mínimo. Um dia dá uma volta, e tudo o que tínhamos como certo, como garantido, torna-se uma incerteza maior que a certeza que algum dia tivemos. O que é considerado um mundo, deixa de o ser. Num simples abrir e fechar de olhos. É como quem te puxa o tapete que tens debaixo dos pés. Sabes perfeitamente que vais cair na p*** da realidade. Não sabes é quando, nem onde essa queda vai parar e te vai levar. Porque subiste demasiado, talvez. Subiste sem medo de cair e não fazias a mínima ideia que, um dia, eventualmente, a tal queda poderia vir a acontecer. Mais dia, menos dia. E sim, sabias que ia doer. Mas não fazias a mínima ideia do quanto ia doer.

E aí cais. E tudo cai contigo. As esperanças. As certezas. As promessas. As memórias. E abres os olhos para a p*** da realidade. Mas algo forçado. E até ofusca. É como quando estás na escuridão do teu quarto e abres as persianas de modo a absorver toda a luz exterior. E sim, custa a ver, mas uma pessoa vai-se ajustando. Umas mais rápido que outras, mas o que importa é ajustar. Ajustes.

Mas, ai! Primeiro que vejas. Melhor! Primeiro que queiras ver! Dor dói, mas custa menos ficar a lamentar que agir. Pensas tu! O caminho mais fácil é esse mesmo. Ficar quietinho (a), à espera que tudo passe enquanto a dor, te consome de uma forma incrível. E daí? É o que parece ser o caminho mais fácil! E é! Mas a curto prazo. A longo prazo torna-se o pior caminho.
Dor dói e entranha-se. Apodera-se de ti. Tira o brilho do olhar, o sorriso nos lábios, a alegria na alma. E assim ficas o tempo necessário até abrires os olhos e veres. Sim ver, não olhar, que são coisas diferentes!

E sabes quem te olha lá de cima? Exactamente! A pessoa que te puxou o tapete! E sabes que mais? Ela está a adorar ver-te aí em baixo. A vista do topo é sempre mais esplêndida, mesmo quando não mereces admirá-la. E que mais? Exactamente, a pessoa que te puxou o tapete ri-se. E goza. E isso é simplesmente como quem crava ainda mais o punhal na ferida. É óptimo estar no topo. "Sou o (a) maior!". E tu, como triste verme, se estás mal, melhor não ficas.
As lágrimas de dor passam a ser lágrimas de raiva e ódio. E é assim, que aos poucos e poucos, te vais levantando. E chegas ao primeiro degrau, da escada que a pessoa que te puxou o tapete subiu para estar lá no topo. E ele (a) ri-se e goza, novamente. E tu, levantas a cabeça, mandas o teu melhor olhar, e sorris também, enquanto activas para ti mesmo o modo: estou-me a lixar. Mas com F!

O ódio consome o que restou do teu coração. Mas a dor, essa, ainda está lá. Escondida, mas está.

E assim vais continuando, subindo um degrau de cada vez. Aprendes a sorrir novamente, aprendes a subir novamente, aprendes a gostar de ti novamente e voltas-te a conhecer. E fazes tudo sozinho (a). Desta vez não precisaste da ajuda de ninguém. Porque aprendeste que há coisas que primeiro, tens de aprender a fazer sozinho, sem a ajuda de quem quer que seja.
E essa pessoa, aquela que está lá no cimo das escadas, a mesma que te puxou o tapete, fica surpreendida. Não estava à espera que conseguisses fazer o que quer que seja sem ela.
É então que te provoca! Primeiro sai a raiva toda, mas depois...depois resta a dor a revelar-se em lágrimas novamente!
E essa pessoa sai novamente sorridente e triunfante. Mas não totalmente!

E assim recomeças a subida. Cabeça baixa novamente. E é aí, é aí que vês! Que realmente voltas a ver! Que vês tudo o que não viste. É a mesma sensação de quando passas 500 vezes pelo mesmo sítio e não te apercebes de metade dos detalhes. E quando te apercebes, ficas fascinado e dizes "mas como é que eu não vi isto antes?"
Então chegas à conclusão que tudo o que tem um lado mau, tem também um lado bom. E acredita, perdeste demasiado tempo com o mau. Viveste demasiado tempo com ele. E já aprendeste tudo o que tinhas a aprender com ele. Como tal deixas-lo ir. Como quem larga um balão. E a raiva, o ódio, o rancor, vão junto.

E continuas a subir as escadas. A pessoa que te puxou o tapete, tenta empurrar-te novamente. Mas já não há nada que ela possa fazer. E, aos poucos e poucos, deixa de te ver e deixa de te reconhecer! E é aí que essa pessoa percebe tudo e tenta consertar o que já não tem concerto. Tenta consertar o que consertaste sozinho. E tens uma ideia melhor, e segues outro caminho. O teu caminho.

E essa pessoa, simplesmente perde-te de vista. E fica intrigado (a). "Como é que ele (a) conseguiu sem mim? É impossível, não acredito".
E então procura-te! Sim, a pessoa que te pediu para desapareceres procura-te. Irónico não é? Então pergunta-te:
-Como é que conseguiste subir as escadas sem mim? E como é que passaste por mim e não te vi?"
-É simples, não me viste porque eu não uso mais as escadas! Eu vou pelo elevador"


E isto pode ser sobre mim, sobre ti, sobre ele, sobre ela, sobre qualquer porra de pessoa que se identifique! E talvez muita gente se identifique. Ou então não.

Em jeito de conclusão, se tens a dizer, diz. Se tens a fazer, faz. Se prometeste, cumpre. Se não podes cumprir, não prometas. Se mentiste, diz a verdade. Se escondes, mostra. Se sentes, demonstra. Mas...tudo isto, e muito mais, no momento certo!!!
Não é no minuto, na hora, no dia, no mês ou no ano a seguir! É na hora! Porque depois, depois já não importa. Depois já pode ser tarde demais. Depois pode não fazer a diferença. E, acima de tudo, deixa de ter e fazer sentido.

E não te rias e gozes de quem te puxou o tapete! Mais cedo, ou mais tarde, vais subir mais alto. E vais estar tu, lá no topo a sorrir! E não a rir ou a gozar. Mas sorris, porque apesar da vitória, tens pena. E gritas cá para baixo "se precisares, eu ensino-te a usar o elevador". Que é como quem diz, alto e bom som "sou melhor que tu, isto é apenas uma forma de prová-lo"

E é assim. E assim é. As voltas que a vida dá. Um dia bem. Um dia menos bem. Um dia mal. Um dia péssimo. Um dia feliz."